As implicações práticas do regime geral de prevenção da corrupção
As implicações práticas do regime geral de prevenção da corrupção
Os ventos da União Europeia trazem consigo a implementação de medidas de prevenção e combate à corrupção, pelo que o programa do Governo reflete as preocupações da agenda europeia quanto a esta problemática global com repercussões ao nível do desenvolvimento das economias nacionais. Nesse sentido, foi aprovado e publicado o Decreto-Lei n.º 109-E/2021, de 09 de dezembro, que cria o Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) e estabelece o Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC). O referido diploma legal entrou em vigor no passado dia 7 de junho de 2022, com exceção do regime sancionatório que só entrará em vigor a partir do dia 7 de junho de 2023 e com a ressalva para as médias empresas, cuja produção de efeitos só terá lugar a 7 de junho de 2024. Centrando as atenções no RGPC, novas obrigações e medidas são impostas às entidades públicas, bem como às entidades privadas, nomeadamente às pessoas coletivas com sede em Portugal que empreguem 50 ou mais trabalhadores e às sucursais em território nacional de pessoas coletivas com sede no estrangeiro que empreguem igual número de trabalhadores. Assim, no futuro próximo que já bate à nossa porta, uma franja considerável das empresas portuguesas vê-se obrigada a adotar e implementar o designado programa de cumprimento normativo, a fim de prevenir, detetar e sancionar atos de corrupção e infrações conexas, levados a cabo contra ou através da entidade. Por conseguinte, as estruturas internas das empresas abrangidas pelo âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 109-E/2021 terão que se adaptar mediante a implementação de medidas e procedimentos internos destinados especificamente às matérias de anticorrupção, o que envolverá esforços e meios humanos, materiais, logísticos e financeiros no sentido de apetrechar a organização empresarial das funcionalidades legalmente impostas. Concretizando um pouco mais o programa de cumprimento normativo, as entidades visadas deverão, desde logo, designar um responsável que efetue o controlo e assegure a aplicação do dito programa. Este programa será composto pela elaboração de um plano de prevenção de riscos de corrupção e infrações conexas (PPR) que, por um lado, identifique os riscos que possam expor a entidade a atos de corrupção e infrações conexas e, por outro, exponha as medidas preventivas e corretivas da ocorrência dos riscos e situações identificadas. Paralelamente, deverá ser delineado um código de conduta que estabeleça um conjunto de princípios, valores e regras de atuação de todos os membros da empresa; também deverá ser criado um programa de formação interna acerca das políticas e procedimentos a adotar nesta sede destinado aos dirigentes e colaboradores das empresas; e, por fim, terá que ser implementado um canal de denúncias, a fim de assegurar meios adequados à receção e tratamento de denúncias de violações do Direito da União Europeia nos mais variados domínios desde, por exemplo, a contratação e saúde públicas até à defesa do consumidor. Ora, é de concluir que o legislador não foi brando no conjunto de imposições consagradas, não se prevendo um processo fácil ao nível da adaptação das empresas, de forma a dar cumprimento a estas obrigações legais. Compreendendo-se a razão de ser destas vastas medidas, associadas às fundadas preocupações no combate à corrupção – o que não deixa de constituir um interesse público –, a verdade é que o ónus será pesado para as entidades visadas. Por outro lado, não se poderá esquecer que o universo destas entidades tem como limite mínimo 50 trabalhadores, o que significa que muitas destas empresas serão empresas de dimensão mais reduzida que, seguramente, terão maiores dificuldades na implementação destes mecanismos e, mais alarmante, muitas delas nem serão conhecedoras do regime. Além disso, é de questionar de que forma o MENAC irá concretizar o controlo da efetiva implementação dos procedimentos, isto é, quais serão as concretas ações de fiscalização a realizar no terreno. De notar que a violação das obrigações legais decorrentes do RGPC constitui contraordenação com a previsão de coimas avultadas no caso de pessoas coletivas ou entidade equiparada (de J 2.000,00 a J 44.891,81 e de J 1.000,00 a J 25.000,00). Ficam as dúvidas no ar, às quais o tempo dará resposta: estará o nosso tecido empresarial preparado para a implementação do RGPC? Estarão as nossas empresas devidamente consciencializadas da sua importância e dos efeitos, ainda que indiretos, nas suas próprias atividades? Será que o RGPC ficará só no papel, não passando de letra morta, cheia de boas intenções, ou será efetivamente aplicado?
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